No Brasil, 8,5 milhões de alunos estão atrasados duas séries na escola

quarta-feira, 21 de maio de 2014


Mais 8,5 milhões de alunos brasileiros estão atrasados pelo menos dois anos na escola. Os dados são do Censo da Educação Básica 2013 e mostram que 6,1 milhões de estudantes do ensino fundamental e 2,4 milhões do ensino médio não estão na série ideal.
Nessas duas etapas de ensino o país tinha 37,3 milhões de matrículas em 2013. São crianças e adolescentes que reprovaram, abandonaram a escola ou já foram alfabetizados com atraso.
"Nós temos esse descompasso, que é a falta de correspondência entre e a idade e o ano escolar. A responsabilidade de solucionar esse problema é do governo federal e dos governos estaduais e municipais, junto com a sociedade. Não é só um problema de gestão do setor público, é uma questão das prioridades que a sociedade estabelece", afirma Maria Beatriz Luce, secretária de Educação Básica do MEC (Ministério da Educação).
O ideal é que o aluno tenha 6 anos no 1º ano do ensino fundamental e complete 14 anos no 9ª ano. Já as três séries do ensino médio devem ser feitas entre os 15 e os 17 anos. A realidade, porém, é que 21% dos estudantes do fundamental e 29,5% do ensino médio não estão na sala correta.
Para especialistas, as principais causas desse atraso são a repetência e a evasão escolar, que refletem problemas estruturais e pedagógicos das escolas. "O fluxo escolar melhora quando há acompanhamento mais perto dos alunos, escolas menores e próximas às casas dos alunos, equipe escolar estável e programas de recuperação ao longo do período letivo", afirma José Marcelino Rezende Pinto, professor da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da USP (Universidade de São Paulo), em Ribeirão Preto.
O pico de defasagem ocorre no 6º ano do ensino fundamental e no 1º ano do ensino médio, fases importantes de transição na vida escolar. No primeiro caso, os alunos deixam salas menores e com apenas um professor para entrar em uma etapa de maior exigência, muitas vezes acompanhada da troca de escola.
"Na primeira fase do ensino fundamental [do 1º ao 5º ano] o aluno tem uma rotina, menos professores, menos disciplinas e está acostumado com um ritmo na escola. No 6º ano pode acontecer de mudar de escola, então há uma adaptação, mais disciplinas e mais professores", afirma Adriana Aguiar, secretária de Educação do Tocantins e vice-presidente do Consed (Conselho Nacional de Secretários de Educação).
O gargalo do ensino médio
Outro ponto de atenção é o início do ensino médio, que já recebe com atraso os alunos repetentes do ensino fundamental. Alguns jovens interrompem os estudos para trabalhar ou, no caso das meninas, para se dedicar a uma gravidez precoce. Para agravar o problema, o ensino médio brasileiro apresenta índices considerados insuficientes nas avaliações educacionais.
"Historicamente, nosso ensino médio foi direcionado à elite e voltado à preparação para os exames de seleção do nível superior. Ao contrário dos países com boas escolas no mundo, que preparam para a vida, com formação básica para o trabalho", afirma Rezende Pinto, especialista em política e gestão escolar. "É uma escola muito ruim do ponto de vista de atrair os meninos para o estudo. Física, química e biologia sem laboratório, por exemplo, são um tédio e nada contribuem para a formação científica".
Além do currículo que não estimula os alunos, um terço das vagas do ensino médio é noturno e os jovens ficam expostos a outros tipos de problemas. "No 1º ano do ensino médio, o desafio se agrava: o jovem já chega atrasado e fica mais vulnerável aos problemas sociais e à violência", diz a secretária de Educação Básica.
O MEC defende que uma das soluções é o Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio, programa de formação de professores que funciona em parceria com as secretarias estaduais. O objetivo, diz Maria Beatriz Luce, é desenvolver um currículo mais interdisciplinar para o ensino médio.

Atraso tem causas sociais e escolares, diz secretária do MEC

A secretária de Educação Básica do MEC (Ministério da Educação), Maria Beatriz Luce, diz que o problema dos 8,5 milhões de alunos que estão na série errada no Brasil tem causas sociais e escolares. Por isso, ela defende: só uma política de Estado com articulação entre os diferentes entes da Federação e parcerias com a sociedade civil pode solucionar esse atraso.
"O MEC considera esse um problema razoavelmente bem diagnosticado e estamos diante de um desafio de qualidade, gestão e planejamento da educação e de atenção da sociedade", afirma a secretária.
Luce defende a necessidade de uma ação integrada com secretarias de saúde e de assistência social, já que as condições de vida da criança dentro da comunidade influenciam no seu rendimento escolar e geram problemas, como faltas e abandono escolar. "No caso da família que tem dificuldades de atenção à saúde da criança desde o seu nascimento, os problemas também se manifestam na escola", afirma a secretária.
Ela ainda diz que outros fatores sociais, como migração dos pais, trabalho, gravidez na adolescência e a (pouca) valorização pela família e pela comunidade do estudo e das atividades escolares, podem causar a repetência e o abandono da sala de aula.
Na escola
Entre os problemas escolares que levam à distorção entre idade e série ideal, Luce afirma que eles vão desde as condições estruturais do colégio até a valorização do professor. No campo e nas periferias das cidades, um dos fatores é a localização das escolas, que muitas vezes exige das crianças verdadeiras viagens até a sala de aula.
"Além do problema de infraestrura e localização das escolas, temos a falta de condições e de espaços necessários para um bom trabalho pedagógico. A escola não tem boas bibliotecas, espaços para aprender as diferentes áreas dos conhecimentos, não tem lugar de recreação", afirma a representante do MEC.
Outro item que tem influência direta no desempenho dos estudantes, afirma Luce, é a falta de professores concursados e estáveis, com a formação adequada para as aulas que leciona.
"Nós temos esse descompasso, que é a falta de correspondência entre e a idade e o ano escolar. A responsabilidade de solucionar esse problema é do governo federal e dos governos estaduais e municipais, junto com a sociedade. Não é só um problema de gestão do setor público, é uma questão das prioridades que a sociedade estabelece", afirma a secretária.

Veja o que os governos podem fazer para reduzir o atraso escolar

Cada ente federativo tem responsabilidades determinadas em ações para diminuir o número de alunos atrasados na escola – segundo o Censo da Educação Básica 2013, 8,5 milhões não estavam na série correta naquele ano.
Especialistas ouvidos pelo UOL listaram alguns dos pontos de atenção para reduzir a reprovação e o abandono escolar, que impactam diretamente na distorção entre a idade e a série. Veja abaixo o que municípios, Estados, o Distrito Federal e a União podem fazer para combater esse problema.
Valorização do professor
"Nos anos iniciais, temos que investir pesado em professores; realmente selecionar de forma a atrair os melhores formandos dos cursos de pedagogia e com um concurso que tenha, além da prova de conhecimento, prova didática", afirma José Marcelino Rezende Pinto, professor da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da USP em Ribeirão Preto.
Os primeiros anos do ensino fundamental estão a cargo dos municípios, que são os responsáveis pela alfabetização dos alunos que ingressam na rede pública. No segundo ciclo (do 6º do 9º ano), Estados e municípios compartilham a responsabilidade, enquanto o ensino médio é oferecido pelos governos estaduais.
São os governos estaduais e as prefeituras, portanto, que devem implementar o piso nacional (reajustado em 2014 para R$ 1.697) e um plano de carreira para a categoria.
Além disso, especialistas dizem que é preciso diminuir o número de professores temporários nas redes públicas de ensino, já que essa forma prejudicaria o trabalho pedagógico desenvolvido nas escolas e o desempenho dos alunos.
Estrutura e financiamento
Apenas 0,6% das escolas brasileiras têm infraestrutura próxima da ideal para o ensino, isto é, têm biblioteca, laboratório de informática, quadra esportiva, laboratório de ciências e dependências adequadas para atender a estudantes com necessidades básicas.
"Além do problema de infraestrura e localização das escolas, temos a falta de condições e de espaços necessários para um bom trabalho pedagógico. A escola não tem boas bibliotecas, espaços para aprender as diferentes áreas dos conhecimentos, não tem lugar de recreação", afirma a representante do MEC.
O nível de infraestrutura adequada inclui os itens considerados mínimos pelo CAQi (Custo Aluno Qualidade Inicial), índice elaborado pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação. Esse custo está previsto no PNE e deve ser cumprido por Estados e municípios, com complementação financeira do governo federal.
"Para se conseguir um salto de qualidade, é fundamental que o governo federal amplie sua participação no financiamento. Hoje ele fica com mais da metade do que se arrecada no país e responde por menos de 20% do gasto em educação. Por isso os 10% do PIB no PNE e para o CAQi", diz o professor da USP.
Alfabetização na idade certa
O PNE (Plano Nacional de Educação), que deveria ter entrado em vigor em 2011 e ainda aguarda votação na Câmara dos Deputados, prevê a universalização da pré-escola para as crianças de 4 e 5 anos e a alfabetização de todas as crianças no máxima até o final do 3º ano do ensino fundamental, quando a criança deve ter 8 anos.
"Algumas crianças entram mais tarde na escola, não fizeram a educação infantil e não tiveram um bom desenvolvimento da linguagem e da coordenação motora fina, que é exigida pela escrita", diz Maria Beatriz Luce, secretária de Educação Básica do MEC.
O Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa, que é um compromisso assumido pelos governos federal, do DF, dos Estados e municípios, já trabalha desde 2012 para a implementação da meta de alfabetização até os 8 anos. No pacto, municípios se comprometem com a alfabetização dos alunos, apoiados pelo auxílio financeiro e técnico de Estados e da União.
Currículo do ensino médio
Um dos principais sintomas da ineficiência do currículo do ensino médio são as taxas de abandono e de atraso escolar no nessa etapa, que é de responsabilidade dos Estados. "Historicamente o nosso ensino médio foi direcionado à elite e voltado à preparação para os exames de seleção do nível superior. Ao contrário dos países com boas escolas no mundo, que preparam para a vida, com formação básica para o trabalho", diz o professor da USP.
Cabe aos Estados oferecer aulas de qualidade na rede pública, enquanto o governo federal é quem define diretrizes curriculares, meio do Conselho Nacional da Educação, e dá assistência técnica e financeira aos Estados.
Está em vigor o Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio, que funciona em parceria entre a União e as secretarias estaduais, e tem o objetivo de atacar o problema no ensino médio. "Nós temos que fortalecer a política de valorização salarial dos professores, e o pacto tem a proposta de formação de professores, que tem um grande impacto na sala de aula", afirma Adriana Aguiar,secretária de Educação do Tocantins e vice-presidente do Consed.
Fonte: Portal Brasil

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